sábado, 23 de março de 2013

O ESSENCIAL É INVISÍVEL; O MAIS ESSENCIAL É INEFÁVEL



Pelo Dicionário encontramos que: Essencial - a natureza primeira das coisas que se opõe ao que nelas seja acidental / Inefável – que não se pode exprimir por palavras/ Admiração - assombro, espanto, estranheza, pasmo, surpresa / Reverência - acatamento, respeito, veneração às coisas sagradas / - crença inabalável, que não tende a razões ou argumentos. Fé divina: crença que se apoia na revelação. Fé humana: a que se assenta na autoridade dos homens. Na vida quotidiana, vivemos absorvidos pelo que não é essencial, não temos muito tempo para a admiração, exercitamos pouco a fé, a reverência está em baixa,e, praticamente não temos contato com o inefável. Parece ser que nossa razão comum tem o viés do que é visível, e exprimível, e, marcadamente na atualidade, “a maior parte da nossa atenção vai para a utilidade, para aquilo que nos traz vantagens”. Na contramão dessa tendência evoco, a seguir, o pensamento de dois autores inspirados, e, que muito prezo, destacando a vivência do  essencial, conquanto invisível, e, do inefável, capazes de despertar nossa admiração, reverência e fé.
O ESSENCIAL É INVISÍVEL, COM DESTAQUE PARA O AMOR.Eis o meu segredo: só se vê bem com o coração. O essencial é invisível aos olhos/ Quem ama vê além da aparência física e é isto que ama: a essência/ Só os caminhos invisíveis do amor libertam os homens/  O verdadeiro amor nunca se desgasta. Quanto mais se dá, mais se tem”. Estas afirmações são do livroO Pequeno Príncipe”, que foi escrito e ilustrado por Antoine de Saint-Exupéry um ano antes de sua morte, em 1944. Piloto de avião, durante a Segunda Grande Guerra, o autor se fez o narrador da história, que começa com uma aventura vivida no deserto depois de uma pane no meio do Saara. Certa manhã, é acordado pelo Pequeno Príncipe, que lhe pede: "Desenha-me um carneiro"? É aí que começa o relato das fantasias de uma criança como as outras, que questiona as coisas mais simples da vida, com pureza e ingenuidade. Em suas andanças pela Galáxia, encontrou diversos personagens a quem perscrutava para descobrir o segredo do que é realmente importante na vida: um rei que pensava que todos eram seus súditos, apesar de não haver ninguém por perto; um homem de negócios que se dizia muito sério e ocupado, mas não tinha tempo para sonhar; ... Assim, cada personagem mostra o quanto as “pessoas grandes” se preocupam com coisas inúteis e não dão valor ao que merece. Exupéry via os adultos como pessoas incapazes de entender o sentido da vida, pois haviam deixado de ser a criança que um dia foram.
O MAIS ESSENCIAL É INEFÁVEL, ENQUANTO DESPERTA ADMIRAÇÃO. Abraham Joshua Heschel foi um dos mais importantes teólogos judeus contemporâneos. O que ele disse - Sobre a admiração - Há 3 aspectos da natureza que se impõem à atenção do homem: a força, a beleza e a grandeza. A força ele explora; a beleza é para seu gozo; e a grandeza enche-o de reverente admiração/ O que nos enche de maravilhado assombro não é o que compreendemos e somos capazes de comunicar, mas o que se situa dentro do nosso alcance e ao mesmo tempo está além da nossa compreensão/ A admiração é um estado da mente em que não olhamos a realidade através da treliça de nosso conhecimento memorizado; um estado em que nada se supõe conhecido/ A admiração é a bússola que pode dirigir-nos ao pólo do sentido das coisas . Sobre o inefável - A pureza sobre a qual nunca deixamos de sonhar, as coisas tácitas que amamos insaciavelmente, a visão do bem pelo qual morremos ou nos entregamos vivos – são realidades que nenhuma razão consegue dominar. É o inefável, do qual haurimos o gosto do sagrado, a felicidade do imperecível / O inefável habita naquilo que é maravilhoso como no que é comum, tanto nos fatos grandiosos, como nos insignificantes/ A música, a poesia, a religião, todas iniciam a alma no encontro com um aspecto da realidade para o qual a razão não tem conceitos e a língua não tem palavras/ O inefável é concebível apesar de ser incognoscível/. O conselho: Deixe de lado idéias preconcebidas; abandone sua tendência de repetir e de conhecer antes de ver; tente ver o mundo pela primeira vez com olhos não ofuscados pela memória ou pela volição. E, a constatação: “quando tentamos encontrar-nos com a realidade face a face, sem a ajuda de palavras nem de conceitos, percebemos que o que é inteligível à nossa mente é somente uma tênue superfície de uma realidade profundamente oculta”. O sobrenatural de Deus inscreve-se no essencial, e no inefável, e, desperta a reverência e a fé -  “Perscrutamos os fenômenos tangíveis com a razão, e com o sentido do inefável auscultamos o sagrado e indemonstrável/ A fé nasce naquele que suspira apaixonadamente pelo sentido supremo das coisas/  A existência de Deus nunca poderá ser provada por pensamento humano. Todas as provas são meras demonstrações da nossa sede dele. Acaso um homem com sede tem necessidade de uma prova de sua sede?/ Não ter fé é insensibilidade; ter fé sem discernimento é superstição”.
Contra a cultura da pressa, e o culto da velocidade, estou aderindo à filosofia do “devagar”, mais atento para escutar os ecos do essencial, e do inefável. Discernir entre o que é essencial e o acessório, é o meu propósito, mas não tem sido fácil; vêm muito misturados, o que requer atenção e oportuno distanciamento. Por outro lado, a experiência do inefável independe da minha vontade, é incontrolável. Posso apenas colocar-me em posições mais favoráveis à sua ocorrência. Imagino que sejam nichos apropriados, as expressões compartilhadas de valorização da vida, mais comuns no ambiente familiar, e dos amigos; as oportunidades aproveitadas de ajuda ao próximo; uma boa leitura seletiva com  insights edificantes; a emoção renovada trazida por um filme, preferencialmente em preto e branco, embalando uma história comum de amor, ou de superação; a escuta de uma canção popular melodiosa, que marcou época, e, o puro som da Natureza, dentre outros. Nestes contextos, coisas que, corriqueiramente, deixariam apenas impressões comuns, e, passariam desapercebidas, como irrelevâncias, não obstante, são passíveis de serem encantadas pelo toque do inefável. Finalmente, peço a Deus que me ajude a abrir os olhos da fé, para contemplar o sobrenatural, que, creio, possa estar tão próximo como a distância da palma da mão, e, em todo lugar.

quinta-feira, 7 de março de 2013

PRIMAZIA DA AÇÃO


Luz, câmera, ação ! assim funciona o Cinema; depois de um planejamento elaborado, segue-se a ação. Na vida real, contudo, temos muita dificuldade em nos transpor do conhecimento para a ação, destacando, nesta oportunidade, aquilo que consideramos como boa intenção. É verdade que esta é uma realidade mais pronunciada em nossa civilização ocidental, que privilegia a observação objetiva – base do pensamento dito racional -  em detrimento da ação concreta.
Um fazer para ser. Bem diferente, na matriz do pensamento oriental, vai-se da ação para o conhecimento. Neste, somos convidados a agir (a passar do pensamento a ação) antes de sermos convidados a pensar mais e mais; “somos estimulados a fazer mais do que compreendemos, para poder compreender mais o que se faz. Viver corretamente é um caminho para refletir corretamente. É nas ações que o homem toma consciência sobre o que sua vida é verdadeiramente. É quando usa a sua vontade, e não a reflexão, que ele encontra seu próprio ser, como ele é, não como gostaria que fosse. Se a filosofia pergunta o que é existir? o que significa ser? Por esta vertente se pondera: o que é realizar? o que significa fazer? qual é a relação entre quem faz e o feito? existe um propósito a ser cumprido em todos os momentos, uma tarefa a ser realizada? “. Afinal, não podemos esquecer que somos conhecidos pelo conjunto dos atos que realizamos, e não propriamente por aquilo que gostaríamos de ser.
Muita informação e pouca ação. Voltando à nossa realidade, diariamente, somos inundados por uma avalanche de informações, algumas, poucas, reais boas novas. Assim recebemos mensagens edificantes, mormente através das redes sociais, onde os amigos compartilham insights que certamente também lhes impactaram, dentre os quais, por sua vez, selecionamos um ou outro, que nos sensibilizaram mais, e, que, eventualmente intencionamos também experimentar. Aqui queremos destacar as “boas novas”, como uma forma de conhecimento que pode nos inspirar uma mudança de atitude e/ou ação proativa. É fácil constatar porém, que mesmo estas, muitas vezes morreram na praia das boas intenções, por assim dizer; vindo obrigações inadiáveis, caíram no esquecimento.
Uma ilustração das diferentes reações que podemos ter, compara-nos com diferentes tipos de solo onde é plantada a semente da boa nova: uma parte é semeada em meio a pedregulhos, onde não há terra bastante, e logo nasce, porque não tem terra funda; mas, vindo o sol, queima-se, e seca-se, porque não tem raiz. Esse é aquele que a ouve, e, instantaneamente a recebe com grande entusiasmo, mas ela não cria raízes, e, então quando aparece alguma dificuldade, ou quando passa o entusiasmo inicial, o assunto é esquecido, e não sobra nada. Outra parte das sementes cai no meio de espinheiros, e os espinhos crescem e sufocam-na. Este é o que ouve a boa nova, mas é vencido pela preocupação e pela ilusão de manter o que tem, e, de ganhar mais; a boa nova é sufocada, e não deixa memória. E, outra parte, cai em terra boa. Este é aquele que passou da superficialidade do mero entusiasmo inicial, e acolheu o assunto no solo profundo do coração, e, então converteu-o  em ação proativa; e, produz frutos: uns poucos, aproveitam cem por cento, outros menos, e, outros menos ainda; mas, de todo modo, valeu a pena!.”(versão adaptada da parábola do Semeador).

P.S. Versão original da “Parábola do Semeador”, contada por Jesus para ilustrar a boa notícia (Evangelho) da chegada do “Reino de Deus”,e as diferentes reações dos ouvintes:
“Eis que o semeador saiu a semear.E, quando semeava, uma parte da semente caiu ao pé do caminho, e vieram as aves, e comeram-na;E outra parte caiu em pedregais, onde não havia terra bastante, e logo nasceu, porque não tinha terra funda;Mas, vindo o sol, queimou-se, e secou-se, porque não tinha raiz.E outra caiu entre espinhos, e os espinhos cresceram e sufocaram-na.E outra caiu em boa terra, e deu fruto: um a cem, outro a sessenta e outro a trinta”. 
E, a sua explicação, dada pelo próprio Jesus:
“Ouvindo alguém a palavra do reino, e não a entendendo, vem o maligno, e arrebata o que foi semeado no seu coração; este é o que foi semeado ao pé do caminho.O que foi semeado em pedregais é o que ouve a palavra, e logo a recebe com alegria;Mas não tem raiz em si mesmo, antes é de pouca duração; e, chegada a angústia e a perseguição, por causa da palavra, logo se ofende;E o que foi semeado entre espinhos é o que ouve a palavra, mas os cuidados deste mundo, e a sedução das riquezas sufocam a palavra, e fica infrutífera;Mas, o que foi semeado em boa terra é o que ouve e compreende a palavra; e dá fruto, e um produz cem, outro sessenta, e outro trinta.”