segunda-feira, 17 de outubro de 2011

UM TRABALHO INCESSANTE


Nestes dias estávamos assistindo uma reportagem no Discovery History Channel, mostrando o resultado do abandono de uma cidade contaminada pelo acidente nuclear de Chernobyl. Sem a presença humana, a invasão da Natureza selvagem levou à rápida desorganização do espaço anteriormente conquistado, com a deterioração de ruas e prédios, que se desmoronavam de forma rápida e irrecuperável. É uma característica desta ação humana, que ela deva ser objeto de atenção permanente, através de um esforço de organização deliberado e sistemático, de manutenção de suas construções e seus bens, produtos das múltiplas formas de ocupação do espaço vital. Numa escala bem reduzida, presenciamos no nosso quotidiano o esforço necessário de arrumação numa casa, também de forma permanente, e que se contrapõe à uma posição de mais repouso, com ausência de qualquer esforço, e que temos a tendência de seguir como lei do menor esforço. No âmbito das Ciências, temos duas Leis fundamentais da Fisica, que nos ajudam a compreender melhor o assunto. A 1ª Lei de Newton, ou principio da Inércia, nos diz que todos os corpos são “preguiçosos” e não desejam modificar seu estado do movimento: se estão em movimento, querem continuar em movimento; se estão parados, não desejam mover-se. Essa “preguiça” é chamada pelos físicos de Inércia e é característica de todos os corpos dotados de massa. Conforme o senso comum, preguiçoso é aquele indivíduo avesso a atividades que mobilizem esforço físico ou mental. De modo que lhe é conveniente direcionar a sua vida a fins que não envolvam maiores esforços. Por outro lado, a Lei da Entropia, nos ensina que a tendência universal de todos os sistemas - incluídos os econômicos, sociais e ambientais – é de passar de uma situação de ordem à crescente desordem; nos informa ainda que todos os sistemas fechados do Universo tendem naturalmente a se desorganizar, tendo como limite o caos e um estado de mesmice, de imobilismo completo, de indiferenciação.
Na direção oposta desta tendência universal, a vida humana surpreendentemente habita num enclave contra esta tendência geral à desorganização. Neste sentido destacam-se duas ações de organização: o trabalho e a cultura. O termo trabalho vem de Poieses -Facere , que implica obra a produzir, e que procura um resultado útil. Trabalho no sentido filosófico, representa nossas ações, iniciativas, vontades, sonhos e realizações. Trabalho, aqui, quer dizer toda forma de expressão humana mais concreta, visível, observável. É sinônimo de ação. Envolve atividade humana para produzir algo, esforço necessário para realizar algo, conjunto de atividades profissionais. Assim, com o trabalho o homem transforma a terra, a água, as pedras; através do trabalho, o homem dá ao mundo um novo vulto, traçando estradas, construindo cidades, parando ou impedindo fluxo das águas. O impacto do trabalho em nossas vidas é enorme: ele é parte importante de nossa experiência total; supre os bens que criam nosso tipo de vida; envolve-nos em muitas de nossas relações humanas; obriga-nos a enfrentar a competição; determina, em parte, nosso estado de tranqüilidade pessoal; oferece-nos oportunidades de satisfação criadoras; e, imprime marca indelével na personalidade. A outra ação de organização em destaque vem a consubstanciar aquilo que denominamos de cultura, que pode ser considerada um amplo conjunto de conceitos, símbolos, valores e atitudes que modelam uma sociedade. Envolve o que pensamos, fazemos e temos como membros de um grupo social.O Mandato Cultural, também denominado de Mordomia da Criação é uma das marcas da Humanidade, e do propósito para ela estabelecido pelo Criador: a reprodução biológica, o uso dos minerais, vegetais e animais, a criação da Cultura, em seus aspectos materiais (objetos, instrumentos, tecnologia) e imateriais (valores, sistemas). Isso porque a Humanidade tem um lugar único na Criação (“a imagem e semelhança de Deus”), por ser dotada de razão, sentimento e vontade. O Mandato Cultural é privilégio e dever;” (Bispo Robinson Cavalcanti, em “Nós e o Espírito do Século “):
Em conclusão, o trabalho e a cultura, conferem ao mundo antes desordenado e estéril ou ameaçador, um certo completamento; e, podemos dizer que estes esforços nos transformam em atores de um processo transcendental de organização, em oposição ao caos e a mesmice, que prescindem de qualquer esforço de organização, e são antes características de um estado de repouso, para o qual, estamos sempre tentados a nos acomodar.

sábado, 1 de outubro de 2011

“JUST DO IT”


Um refrão usado em camisetas atualmente na moda, a expressão, que quer dizer simplesmente “apenas faça”, e enfatiza a necessidade de ação já; é uma crítica bem humorada à saturação de conhecimentos que nos mantém apáticos, meros espectadores da vida que passa. Em nossa experiência de vida há mesmo um grande abismo entre aquilo que pensamos, e aquilo que vivenciamos, para não dizer daquilo que conseguimos realizar. Dando um balanço rápido, facilmente constatamos que desperdiçamos a maior parte do tempo, seguindo a onda, isto é, quando estamos apenas sendo levados. Fazemos muitas coisas que não acrescentam nada, nem mesmo alegria do momento, e desta forma desperdiçamos tempo e oportunidades de fazer coisas mais interessantes e que gratifiquem.Da linguagem do dia a dia, selecionei duas expressões consagradas e que se contrapõem, conforme cantadas por dois compositores populares contemporâneos: de um lado os versos “quem sabe faz a hora, não espera acontecer”, e do outro “deixa a vida me levar, vida leva eu”. São duas expressões que gostamos de repetir, quando a ocasião aparece, e que revelam estados de espírito, diametralmente opostos, que podemos classificar de ativismo e imobilismo. Como sói acontecer, a sabedoria está em alguma zona intermediária entre estes extremos; alinho a seguir algumas pistas que nos facilitem encontrar o caminho para esta zona de equilíbrio.

A IMPORTÂNCIA DO FAZER. Alguns sábios nos deixaram lições preciosas sobre o assunto; dentre estes destacamos os seguintes registros: SÓCRATES(469-399 aC, nascido em Atenas, tradicionalmente considerado um marco divisório da história da filosofia grega) - “desenvolvia o saber filosófico em praças públicas, conversando com os jovens, sempre dando demonstrações de que era preciso unir a vida concreta ao pensamento. Unir o saber ao fazer, a consciência intelectual à consciência prática ou moral”. KIERKEGAARD (1813-1855, filósofo de referência e teólogo dinamarquês, e um dos pais da corrente de pensamento existencialista). Inspirado por Sócrates, grande parte da sua obra versa sobre as questões de como cada pessoa deve viver, focando sobre a prioridade da realidade humana concreta em relação ao pensamento abstrato, dando ênfase à importância da escolha e compromisso pessoal. Para ele, o pensamento não tem sentido sem a ação: “O que realmente preciso é esclarecer para mim mesmo o que devo fazer, e não aquilo que devo saber, a não ser na medida em que o conhecimento precede toda ação...o fundamental é encontra a verdade que é verdade para mim, encontrar a idéia pela qual vou viver e morrer... é disso que preciso para poder levar uma vida plenamente humana e não apenas uma vida de conhecimento... é disso que preciso e é isso que busco”. NO JUDAÍSMO – “um judeu é antes convidado a agir - passar do pensamento à ação – em vez de ser convidado a pensar. Ele é estimulado a ultrapassar suas necessidades, a fazer mais do que ele compreende, para poder compreender mais do que ele faz. É nas ações que o homem toma consciência sobre o que sua vida é verdadeiramente, sobre seu poder de fazer mal, ferir e ofender, destruir e arruinar; sobre sua capacidade de criar alegria e derramá-la sobre as outras pessoas; sobre aliviar e aumentar suas tensões e as tensões alheias. É quando usa a sua vontade, e não a reflexão, que ele encontra seu próprio ser, como ele é; não como gostaria que fosse".

O CAMINHO DA AÇÃO PARA A CRENÇA. KIERKEGAARD - "o Evangelho não se resume a uma série de idéias descritas por teólogos: é um evento. Só o conhecemos verdadeiramente quando participamos ativamente desse evento – como participantes de fato e não apenas como espectadores. Ele queria se referir às conseqüências que são produzidas exclusivamente por um encontro pessoal com Jesus Cristo, e a resposta do homem a esse encontro. Cristo não estabeleceu doutrinas... ele agiu". Kierkegaard protestava contra o fato de estar sendo saturado com conhecimento factual sobre o cristianismo. Em sua cultura dinamarquesa, muitos estavam sendo inundados com tanta informação religiosa que se mantinham inconscientes da superficialidade de sua vida. Ele quer nos mostrar que precisamos desenvolver a capacidade de viver a verdade, o que requer uma comunicação mais profunda no contexto da vida ... A fé, a esperança e o amor não passarão de conceitos, a menos que se reconheça a possibilidade e a própria existência da capacidade de confiar ,esperar e compartilhar o amor. LIÇÕES DO JUDAISMO – jamais aprenderemos a compreender Deus a não ser que aprendamos a louvá-lo, a não ser que saibamos como amá-lo; assim como seria inútil por exemplo, investigar o sentido da música e não ouvir música. O conhecimento de Deus é o conhecimento de viver com Deus. O verdadeiro sentido da vida é revelado nos momentos que vivemos na presença de Deus.
A SANTIFICAÇÃO DO FAZER. TEILHARD DE CHARDIN em “O Meio Divino”: "Nada é mais certo, dogmaticamente, do que a santificação possível da ação humana. “Tudo o que fizerdes, diz S. Paulo, fazei-o em nome de Nosso Senhor Jesus Cristo.” Trata-se realmente da vida humana toda, mesmo nas zonas chamadas “naturais”. Toda a vida humana é declarada pela Igreja santificável. “Quer comais, quer bebais...” diz novamente S. Paulo. Uma solução incompleta: a ação humana vale, e só vale pela intenção com que é feita. A divinização do nosso esforço pelo valor da intenção que nele se põe infunde uma alma preciosa a todas as nossas ações; mas não dá ao corpo a esperança de uma ressurreição. Ora, é esta esperança que nos é necessária, para a nossa alegria ser completa. A solução definitiva: todo o esforço coopera no acabamento do mundo “in Christo Jesu”. No seio do nosso Universo, toda a alma é para Deus, em Nosso Senhor. Mas, por outra parte, toda a realidade, mesmo material, à volta de cada um de nós, é para a nossa alma".