Em nossos dias, em que a democracia é uma
unanimidade, pelo menos como alvo quanto à melhor forma de governo, o
mérito se destaca como um valor fundamental. Do dicionário popular, “o
termo “mérito” designa, em geral, a retribuição devida, e, se relaciona com a
virtude da justiça, em conformidade com o princípio da igualdade, que a
rege. A Meritocracia (do latim “meritu”, mérito, e “cracia”,
poder) é um sistema que considera o mérito (aptidão) a razão para se atingir
determinada posição. O principal argumento em favor da meritocracia é que ela
proporciona maior justiça do que outros sistemas hierárquicos, uma vez que as
distinções não se dão por sexo ou raça, nem por riqueza ou posição social,
entre outros fatores biológicos ou culturais. Além disso, em teoria, a
meritocracia, através da competição entre os indivíduos, estimula o aumento da
produtividade e eficiência” no conjunto da sociedade.”
Uma pessoa pode até mesmo ser invejada, mas não se
questiona o sucesso e a prosperidade em quem se reconhece méritos, ao ensejo em
que condenamos quem não os tem. O mérito nos proporciona assim, uma base aceita
por todos, comumente considerada nos mais diversos processos seletivos. É como
se conferisse ao seu portador um atestado de valor justo e inquestionável.
Desejamos, também, merecer tudo que temos, como
sendo o fruto legítimo de nosso esforço; de outra parte, não valorizamos tanto
aquilo que recebemos gratuitamente, assim como o ar que respiramos. É como se
só tivesse real valor aquilo que por direito conquistamos com esforço próprio;
ou não acreditássemos em um outro sistema de valor que não envolvesse a
retribuição devida.
A meritocracia levada ao extremo, além de estimular
a competitividade, acentua a individualidade, o valor pessoal, em detrimento da
solidariedade; exarceba a autosuficiencia, e não raro enseja a soberba e a
vaidade pessoal; afinal, aqui tudo se compra, e nada se dá.
Uma
outra ordem das coisas, a
Graça, põe o foco no “outro" de cuja ação primeira, nos
beneficiamos, até mesmo sem contrapartida. É a esfera do favor imerecido, e
aponta para nossa dependência uns dos outros, enfatizando nossa fragilidade, e
vulnerabilidade. É o combustível da amizade verdadeira, da doação sem pedido
prévio, e nada tendo em troca. Estimula a gratidão e tira o foco do ego. Aqui,
de graça se recebe, e de graça se dá; dá sem olhar para trás ou para frente, na
busca de compensação.
Na economia divina, “Graça é
um conceito teológico fortemente enraizado
no Judaísmo e no Cristianismo,
definido como um dom gratuito e sobrenatural dado por Deus para
conceder à humanidade todos os bens necessários à sua existência e à sua salvação.
Esta dádiva é motivada, unicamente, pela misericórdia e amor
de Deus à humanidade, logo, movida por Sua
iniciativa própria, ainda que seja em resposta a algum pedido a Ele dirigido. E
também por esta razão, a Graça é um favor imerecido pelo Homem, mas sim fruto
da misericórdia e amor divinos”. A Biblia registra como
uma aplicação indevida do sistema da meritocracia, transformou uma lei santa,
enquanto expressão da vontade de um Deus amoroso, em um código rígido, cuja
obediência era necessária para se obter o direito à salvação. A lei, então
distorcida como intermediário entre Deus e o homem, ensejou um ensino
legalista, que resultou em soberba e confiança em si mesmo, concomitantemente
com a busca, sem saída, de alcançar justiça pelos méritos próprios, através da
realização de boas obras, que seriam então, finalmente, recompensadas por Deus
no além. Mas, na verdade, a Bíblia também nos ensina, que é somente pela fé, -
nos méritos da grande obra salvífica de Jesus Cristo - que podemos alcançar
justiça. Ocorre que, nesta esfera, nada merecemos, e tudo nos foi oferecido
gratuitamente. É a lei da graça, e, não propriamente, da meritocracia, aquela
que nos dá uma dimensão mais profunda da nossa posição na economia divina.
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