quinta-feira, 28 de julho de 2011

TEMPO E DINHEIRO


Numa época em que tomamos crescente consciência de muitos recursos escassos, ameaçando a vida do Planeta, dois outros recursos também críticos, nos desafiam a imaginação; são eles: o tempo (de vida) e o dinheiro. Existe mesmo um vínculo forte entre a acumulação de dinheiro, e a forma como ocupamos nosso tempo.
A novidade em relação ao papel do dinheiro na atualidade. O renomado autor Jacob Needleman em seu sugestivo título “O Dinheiro e o significado da vida”, pondera que o dinheiro representa a principal força-motriz da vida humana na atual fase de civilização. “Em nossa época, as forças que definem a vida do homem manifestam-se por intermédio do dinheiro. Inventado para facilitar a aquisição e a distribuição da riqueza, o dinheiro, no mundo em que vivemos, participa também de tudo o que o homem faz e penetra em todos os compartimentos da vida, desempenhando um papel de importância sem precedentes em nossas vidas interior e exterior, e qualquer empenho sério no autoconhecimento e no auto-desenvolvimento requer o exame do real significado que ele tem para nós... Nossa sociedade priorizou a posse material na vida cotidiana... Cobiçamos a riqueza mais que qualquer outra coisa... O problema é grave porque as experiências que temos com o dinheiro se tornaram as mais excitantes e intensas de nossas vidas".
Outros registros afins. Competindo com este fruto tentador que ocupa grande parte do nosso tempo, podemos alinhar os desenvolvimentos possíveis de valores ditos espirituais, por oposição aos benefícios materiais advindos do dinheiro. E, dentre estes, destacamos os valores religiosos. Passando a largo da controvérsia em torno da Teologia da Prosperidade, que ensejou títulos do tipo “Deus quer que você seja um milionário", encontramos condenações mais explícitas ao amor ao dinheiro, como na parábola bíblica do rico insensato, admoestado sobre a possibilidade de lhe sobrevir tempestivamente a morte, sem maiores proveitos da riqueza acumulada. Mais pessoalmente, trago na memória expressão ouvida há muitos anos, de uma liderança tranqüila na Igreja, de seu orgulho pelo primeiro milhão de R$ (hoje seria de U$) que seu filho já teria atingido ainda antes dos 25 anos, e um outro registro mais recente, de um caro professor de religião, num exercício de livre imaginação, defendendo a tese, de que até mesmo alguns Discípulos de Jesus Cristo, teriam sido prósperos empresários da industria da pesca, no contexto em que viveram???.
Conclusões provisórias. É inegável o impacto avassalador do dinheiro na atualidade, para o que, de acordo com o autor citado no inicio, “temos de conceder às necessidades materiais a energia e a inteligência exigidas para satisfazê-las, ao mesmo tempo que reservamos dentro de nós espaço para encetar a busca de significado transcendental. Descubramos o que em nós pertence à esfera transcendental e o que pertence à esfera material . Em seguida , precisamos atribuir a cada uma o que lhe é devido”. Ponderamos também que o papel distorcido do dinheiro hoje, faz parte de cosmovisões, com modelos reduzidos e parciais da realidade, como o racionalismo do século XVIII - com o mito da razão dita objetiva e verdadeira, que não obstante a própria Ciência vem relativizando - o materialismo, o pragmatismo, e tantas outros ismos que se traduziram em correntes de pensamento ainda impactantes no dia a dia. E, certamente que, debaixo de uma cosmovisão “viciada”, a racionalidade da acumulação de riqueza é avassaladora, em detrimento da ética, e de outros valores mais inerentes a experiências não tão rentáveis, como o sentido do inefável, do respeito, da admiração, e, não por último, da fé, na avaliação do que realmente importa ocupar nosso tempo. A isto acrescentaria que precisamos identificar e isolar o poder idolátrico do dinheiro, que pode nos manter como que prisioneiros, assim como ilustrado no mito da caverna, desenvolvida por Platão. Nos termos do autor referido, “nossa relação com o dinheiro hoje, constitui um dos fatores principais que nos mantém na prisão, em que as grades e as correntes estão dentro de nós”. Por último agregaria que, superadas as barreiras financeiras comuns que assegurem uma vida digna, sobretudo nesta terceira idade, o recurso mais escasso é mesmo o tempo de vida útil, e, como tal, deve ser objeto de maior cuidado no seu emprego.

2 comentários:

  1. Registro de comentário
    de ieda egg iedaegg@yahoo.com.br
    Concordo plenamente que vivemos em função de ganhar dinheiro e, também, somos dominados pelo passar do tempo em nossas vidas. Ganhar dinheiro para obtermos os bens de consumo, nem sempre essenciais, na maioria das vezes, supérfluos. E deixamos que o tempo voe, sem aproveitá-lo com o que realmente é importante. Tentamos estabelecer metas, planejamos, sonhamos, mas, a bem da verdade, somos levados pelas marés, pela correria do dia-a-dia , pelas circunstâncias à nossa volta, sei lá o que mais... e o fim se aproxima!
    O que resta então? Colocarmos em primeiro lugar os valores transcendentais, as coisas do espírito, o reino de Deus, que no concreto da vida se revelam através do AMOR, a Deus e ao próximo.
    Fácil falar, não? A teoria é uma beleza. O conhecimento intelectual da VERDADE a gente até tem. Que DEUS nos ajude!

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  2. Registro de comentário
    de Roberto R. de Avillez avillez@puc-rio.br
    Não me parece que dinheiro é a principal força motriz da maioria das pessoas. De fato, dinheiro é o meio para alguém alcançar o que deseja. Acho que a força motriz é o desejo consciente, ou inconsciente, que as pessoas possuem de copiar, ou ter, determinado conhecimento, ou objeto. Pode ser poder, uma casa, uma roupa, etc. O dinheiro serve como o meio para se alcançar este desejo. Talvez um grupo extremamente reduzido de pessoas possam ter o desejo de ter dinheiro pelo dinheiro. A maioria deseja ter algo que vê nos outros. Este é o desejo mimético mencionado por René Girard. A Bíblia menciona este desejo em várias passagens desde Adão e Eva até mesmo por Paulo. O fato de desejarmos copiar, ou ter alguma coisa, não é algo que devemos considerar como errado. Sem nossos desejos, não podemos avançar, aprender e crescer como seres humanos. De fato Paulo, cônscio deste desejo natural do ser humano, propõe uma maneira de nos libertarmos dos perigos subjacentes quando em 1Cor 11:1, ele escreve "sede meus imitadores, como também eu sou de Cristo", isto é, imitem a Cristo.

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