“Não
professo religião alguma, mas rezo todos os dias. Acredito no poder da oração.
Mas as instituições religiosas, e incluo todas as ordens, estão preocupadas com
política e poder”, Gilberto
Gil, ex. Ministro da Cultura. A expressão não passaria de um lugar comum sobre
as benesses e o apego ao poder, apenas destacada pelo brilho dos holofotes que
cercam as celebridades. Publicada na Revista Ultimato (edição mai-junho 2013),
que traz também um artigo sobre o “pecado da simonia”, onde se aponta o
surgimento no País, de uma “teologia duvidosa, resultando de uma interpretação
tendenciosa e altamente seletiva da Bíblia, consoante a qual, os principais
lideres desses movimentos vêm demonstrando uma atitude em relação ao dinheiro
que em nada difere do velho pecado da simonia (tráfico de poder que derivou o
seu nome de Simão, o mágico, um personagem bíblico que tentou comprar dos
apóstolos o poder de conceder o poder do Espírito Santo àqueles sobre os quais
ele impusesse as mãos). Também podemos encontrar o vírus da vontade de poder,
mesmo num pedido aparentemente inocente de dois dos mais próximos Discípulos de
Jesus, para que, por ocasião da chegada do seu “Reino de Deus”, que um
se sentasse à sua direita e outro à esquerda. Na
base destes, e de muitos outros registros afins, está um velho e arraigado
anseio humano de “vontade de poder”, e, que conforma uma cultura,
dominante na atualidade, onde a autoridade do mundo é exercida pelos detentores
de poder, ensejando, o modo de raciocínio do presente século que impõe sobre o
homem, o reino do mando: “manda quem pode, obedece que tem juízo”. Um
dos filósofos de maior influência no mundo moderno, Nietzsche, foi um dos
maiores apologistas desta cultura, sendo a vontade
de potência a ferramenta que
utilizou para analisar a motivação humana. Por esta ótica, ele via a “civilização,
como tendo sido criada pelos fortes, pelos inteligentes, pelos homens
competentes, os líderes que se destacaram da massa. Moralistas como Sócrates e
Jesus, porém, ao propagaram uma moral que protegia os fracos dos fortes, os mansos
dos ousados, que valorizava a justiça em vez da força, inverteram os processos
pelos quais o homem se elevou acima dos animais e exaltaram como virtudes,
características típicas de escravos: abnegação, auto-sacrifício, colocar a vida
a serviço dos outros. Mas, segundo Nietzsche, é a vontade de
poder que permite ao indivíduo desenvolver seu potencial máximo de modo a
se tornar-se um super-homem ou um ser além do homem - isto é,
que se coloca acima da massa”. Levado
aos seus extremos, este modo de pensar encontrou eco no nazismo que tanto mal
trouxe à humanidade. Voltando ao articulista da citada revista, “a forma desse desejo de potência se
modificou ao longo dos séculos, mas sua fonte é ainda o mesmo vulcão.. O que
antes fazíamos “por amor a Deus” fazemos agora “por amor ao dinheiro”... É isso
que no momento confere a mais elevada sensação de potência”.
Na
direção oposta desta cultura do poder, destaca-se a genuína “contracultura
cristã” alicerçada na vida e
nos ensinamentos de Jesus Cristo, dos quais destacamos as motivações que devem
embalar seus seguidores: felizes
são os humildes de espírito, os que choram, os que têm fome e sede de justiça,
os perseguidos por causa da justiça, os mansos, os misericordiosos, os
pacificadores, os limpos de coração. Neste
sentido, precisamos mesmo ter uma mentalidade diferente da que o mundo tem: a
autoridade do mundo provém da posição que se ocupa, a do Reino de Deus vem do
serviço que se presta. O modo de raciocínio do mando: “manda quem pode,
obedece quem tem juízo” deve ser substituído pelo “manda quem serve,
lidera quem dá o exemplo da disponibilidade para servir”.
Finalmente
desejo salientar duas situações neste contexto: a primeira diz respeito à
tentação, quando não inveja ocasional, em relação àqueles que aparentemente têm
o poder. Neste caso podemos encontrar, um insuspeito autor de salmos da Biblia,
quando confessava a tentação, que “sem dúvida, Deus é bom – bom para os
bons, bom para os de bom coração. Mas quase o deixei escapar; quase deixei de
ver sua bondade. Porque eu estava olhando para o outro lado, observando as
pessoas que alcançaram o topo, invejando os ímpios que tinham sucesso, que não
têm com o que se preocupar e nenhum problema a resolver... Os ímpios estão com
tudo: alcançam o sucesso e ajuntam riquezas... Até que entrei no santuário de Deus...e compreendi”. Na segunda situação, destaco, os muitos registros
históricos, de uma animosidade dos transtornados pela cultura do poder, em
relação àqueles que se orientam pela contracultura cristã. Aparentemente, pelos
valores que defendem, de paz e amor ao próximo, o senso comum é de que estes
pacifistas, seriam no mínimo objeto de admiração. A realidade é bem outra, e a
história mostra as perseguições movidas contra tais, com destaque para os
mártires do cristianismo. Não é por outra que, entre os bem-aventurados, Jesus
adverte, “considerem-se abençoados sempre que forem agredidos, expulsos ou
caluniados para me desacreditar...”.
P.S. por oportuno, acabo
de ler, e, recomendo, o romance “O cristo recrucificado”, de Nikos
Kazantzakis (mesmo autor de Zorba,
o grego), que mostra um quadro bem composto desta conjuntura hostil, aqui
dirigida contra homens simples, escalados para participarem na encenação
da “Paixão de Cristo”, e, que passam a vivenciar os valores da contracultura
cristã, sendo doravante objeto da hostilidade e perseguição de sua gente.
Comentário do mano, Pr. Carlos Alberto: Parabens !
Muito bem colocado e muito oportuno. A INVEJA é o pecado mais antigo. Esteve na base da rebelião de Lucifer e o fez tornar-se Diabo(queria o trono de Deus). Esteve na base do pecado de Adão e Eva(queriam o conhecimento de Deus) e está por traz de adultérios, assassinatos, roubos, maledicencia, entre outros. Enviado via iPhone
Exatamente! E o pior é que em uma sociedade baseada na competição o poder (no sentido mais genérico do termo) é uma condição para a sobrevivência. Quando impera a lei do mais forte, o poder é naturalmente o primeiro e principal objeto de desejo. De modo que aceitar a vocação para servir é, antes de tudo, aceitar a morte. É decidir abrir mão da própria segurança, para ser devorado por aqueles a quem se serve. Foi assim com Cristo...
ResponderExcluirPS: Não conhecia ainda este livro do Nikos, só "A Última Tentação de Cristo". Acho que ele tem umas sacadas interessantes, mas não gostei da cristologia dele.