O olhar entediado (Eclesiastes)
A questão de fundo do livro é “o sentido da vida” (Religião existe também e principalmente para oferecer sentido – direção e significado – a vida. O sentido da vida abordado sob a ótica da vida que vale a pena ser vivida; “Eu queria saber o que vale a pena, debaixo do céu, nos poucos dias da vida humana” (2.3).
“Eu, o mestre, fui rei de Israel. Dediquei-me a investigar e a usar a sabedoria para explorar tudo o que é feito debaixo do céu” (1:12-13).
Afinal a vida sem reflexão não faz sentido. Mas a vida com reflexão é o que? O Eclesiastes diz que é canseira, enfado, é correr atrás do vento. Mas ele não para por aí, e segue investigando e explorando, mesmo depois de chegar à conclusão que a vida é um absurdo.
Absurdo, fútil, inútil e injusto: essas são as qualificações que dá ao trabalho que o homem realiza debaixo do sol. O mundo que ele vê é repetitivo e enfadonho. Por um fim ao tédio é o desafio que o Eclesiastes propôs para nós. Precisamos vencer o tédio para que a vida ganhe sentido.
O Eclesiastes olha para o mundo e não capta sentido no que vê e no que faz, pois o que ele descreve é exatamente o que o mundo nos parece quando ficamos contaminados pelo tédio. Para o Eclesiastes o mundo é um processo de repetições enfadonhas, sem variações que atraiam o interesse, pois “não há nada de novo debaixo do sol”. Mas ele sugere também que não existe apenas uma maneira de viver. Se o tédio causado pela repetição é o problema, a solução é a experiência individual – a chance que cada um tem de fazer pela primeira vez o que as gerações anteriores têm feito há séculos.
(O livro mais mal-humorado da Bíblia, de Ed. René kivitz)
O olhar com sentido (Viktor Frankl)
O homo sapiens move-se entre o extremo positivo do sucesso e seu contrário negativo do fracasso. É bem diferente aquele que chamo homo patiens, e que move-se ao longo do eixo perpendicular entre os dois pólos da realização (de si através de um sentido) e do desespero (falta aparente de sentido para a própria vida.
Os caminhos através dos quais podemos encontrar sentido são: vivenciando, ao nos entregarmos a uma obra, tarefa ou pessoa; ou criando, ao nos dedicarmos a uma obra, tarefa ou pessoa. Os valores vivenciais e os criativos são os meios que usamos para dar uma forma plena de sentido à nossa vida. Em ambos os casos, o sentido é uma forma de dedicação ou entrega a um valor, e, se isto não for possível, se nossa capacidade de trabalho e de prazer estiver perdida, abre-se, apesar de todos os reveses, uma nova possibilidade, aquela de, através de nossa atitude, lutar por um sentido pessoal, o mais pessoal de nossa vida ( o sentido que é possível encontrar em um sofrimento).
Viver com sentido significa, de maneira bem simples, realizar a tarefa que surge num dado momento. A tarefa pode consistir em nada fazer numa determinada hora, descansar, ouvir música, saborear uma boa refeição No momento seguinte, a tarefa pode ser, a de dar assistência a alguém ou realizar um trabalho. Viver com sentido, significa descobrir o melhor valor possível dentro de uma situação e realizá-lo.
Não se trata de qualquer valor, escolhido ao acaso, mas aquele que, nesta situação, é considerado, pelo meu conhecimento e minha consciência, como sendo o melhor valor. O sentido é então sempre aquilo que especificamente deveríamos fazer agora, aquilo que, em um dado momento, deveria ser feito. A possibilidade de sentido é sempre uma oferta ou um apelo daquele momento.
(Em busca de sentido, de Viktor Frankl)
O olhar atento (Josep Esquiró )
A essência do respeito é o olhar atento. Paradoxalmente a total facilidade de olhar contrasta com a dificuldade de olhar bem. Ver somente o mero visual, quase não custa nenhum esforço (daí o êxito da TV), enquanto que olhar bem, custa muito; dirigir o olhar e concentrar-se em algo já supõe um esforço e acarreta portanto um cansaço. O movimento da atenção não é freqüente, mas raro. Na maioria das vezes tendemos a tratar as pessoas e as coisas automaticamente, seguindo normas de conduta assumidas, geralmente, de forma acrítica. Mas, com esse modo de proceder, as coisas na realidade não se mostram a nós, ou a fazem apenas superficialmente.
A atenção dota o olhar de um significado moral. Atenção é o primeiro movimento com significação ética. O respeito requer uma atenção e a atenção um acercamento, uma aproximação.Quem presta mais atenção melhor se orienta e mais respeita. O caráter fundacional do respeito situa-o no mesmo nível de importância que se costuma reconhecer à capacidade técnica. O respeito junta com a justiça é elemento indispensável para criação da sociedade. O respeito ocupa um lugar importante na atitude moral do ser humano; a mesma importância que se dava ao amor à piedade ou ao egoísmo. Movimento de respeito vs indiferença e a avidez de posse e de consumo.
O olhar com admiração (Joshua Heschel)
O rabino Heschel nos propõe resgatar o olhar da criança e o reaprendizado que é o espanto frente ao deslumbramento da criação na trilha do maravilhoso mistério e no ato divino, que a tudo envolve desde a primeira inspiração. A percepção em relação ao divino começa com a admiração; e o caminho para a fé conduz a atos de completa admiração. Admirar vem do grego thaumázein, que significa ver e, no ato de ver, sentir o estranhamento do que aparece. O que nos enche de maravilhado assombro não é o que compreendemos e somos capazes de comunicar, mas o que se situa dentro do nosso alcance e ao mesmo tempo está além da nossa compreensão. A admiração é um estado da mente em que não olhamos a realidade através da treliça de nosso conhecimento memorizado e cristalizado. O termo admiração é derivado de miraculum – milagre. O que nos falta não é a vontade de crer, mas a vontade de admirar. Este é um dos objetivos do modo judaico de viver: vivenciar os atos comuns como aventuras espirituais para sentir o amor à sabedoria que está oculto em todas as coisas.
(“Deus em busca do homem”, de Abraham Joshua Heschel)
Péricles,
ResponderExcluiré isso aí. Para quem se considera um "leigo" em computação, você está se virando muito bem!
Assisti com interesse a sua aula na Escola Dominical, pois recentemente andei (re)lendo um "clássico" da literatura cristã (J.I. Packer - "O Conhecimento de Deus") e ele menciona Eclesiastes em um de seus capítulos (sobre a Sabedoria Divina). Eis o que Packer escreve:
"O que o pregador quer mostrar [...] é que a base real da sabedoria é o reconhecimento sincero de que o curso do mundo é enigmático, que muitas das coisas que acontecem são inexplicáveis e muitas das ocorrências 'debaixo do sol' não têm qualquer sinal exterior de uma ordem racional e moral para elas. [...] O Deus que rege tudo, se esconde. Raramente este mundo se parece com um lugar que esteja sendo dirigido por uma Providência benevolente. [...] Pois a verdade é que Deus, na sua sabedoria, para nos manter humildes e para nos ensinar a andar pela fé, escondeu de nós quase tudo o que gostaríamos de saber a respeito do propósito providencial que ele está realizando nas igrejas e nas nossas vidas. [...] Mas, neste caso, o que é sabedoria? [...] 'Teme a Deus e guarda os seus mandamentos' (12:13); confie nele e lhe obedeça, respeite-o e o adore, seja humilde diante dele e nunca diga mais do que o necessário e do que pretende cumprir quando ora diante dele (5:1-7); faça o bem (3:12); lembre-se de que Deus algum dia lhe pedirá contas (11:9; 12:14); evite, então, mesmo em segredo, coisas das quais se sentirá envergonhado se vierem à luz quando Deus vier julgar (12:14). Viva no presente e goze completamente a sua condição (7:14; 9:7; 11:9); as alegrias de agora são bons presentes de Deus. Embora Eclesiastes condene a leviandade (7:4-6), ele claramente não tem tempo para a superespiritualidade que é muito orgulhosa ou 'piedosa' para poder rir e se alegrar. Busque a graça para realizar corretamente qualquer coisa que a vida lhe ofereça (9:10) e tenha prazer neste trabalho (2:24; 3:12; 5:18; 8:15). Deixe os resultados por conta de Deus; deixe que ele os avalie; a sua parte é usar todo o bom senso e criatividade a seu dispor para explorar as oportunidades que estão à sua frente (11:1-6). Isto é sabedoria." (págs 94-95).
Desculpe pelo comentário longo! Abraços,
Luiz Augusto
O maior sentido da vida está nas relações humanos.
ResponderExcluirAb,
Marluci